As 8 etapas do ciclo de vida de um contrato de TI – Parte I

Toda aquisição de tecnologia ou serviço de TI (tecnologia da informação) realizado por uma organização, de qualquer porte, passa por um ciclo bem definido que pode ser classificado em 8 etapas distintas. Infelizmente, no Brasil, a cultura do imediatismo, a ausência de conhecimento e a visão estratégica reduzida agravam a execução e a percepção da existência destas etapas. Mesmo que as contratações sejam de pequena monta, o ciclo todo acontece, independente, da vontade da organização. Obviamente, ele apenas não é tão formal em organizações menores, mas acontece sempre, mesmo que involuntariamente. Há diferentes atores em cada etapa. O processo do ciclo de vida não é uma exclusividade ou responsabilidade da TI.

Isso deve ficar muito claro. O setor de TI, neste caso, pode ser o ator principal na maioria das etapas, mas há outros que podem e devem estar harmonizados com a TI para que o resultado do ciclo seja sempre favorável a organização contratante. Se houver uma percepção melhor de quando e como estas etapas acontecem, os resultados finais da contratação e da utilização das tecnologias e serviços relacionados terão muito melhor resultado e as taxas de sucesso em projetos estratégicos serão superiores aos atuais.

Em sua grande maioria, as organizações, suprimem ou pouco se preocupam com a mais importante e fundamental, que é a etapa 1: o planejamento da aquisição. É onde deveria se gastar o maior tempo de inteligência e análise crítica, se colocarem os melhores recursos para que as demais acontecessem e fluíssem normalmente. Aliás, é nela, que todas as outras 7 etapas serão descritas de como devem acontecer. Os tantos insucessos e decepções em contratações de tecnologias e serviços de TI atualmente passam, obrigatoriamente, pela sua maior causa: a ausência ou deficiência no seu processo inicial de planejamento da aquisição.

Na primeira etapa, a do planejamento da aquisição, é que surge e são estabelecidas, de forma transparente, a necessidade do negócio em função dos seus objetivos estratégicos e que, fundamentalmente, deveriam obrigar os líderes do processo a se prepararem satisfatoriamente para esta demanda. Nesta etapa é primordial se levantar os objetivos da aquisição, retorno esperado, os seus requisitos, modelos contratuais que serão aceitos, tipos de suporte e/ou manutenção envolvida, níveis de serviço mínimos, a capacidade de investimento, os critérios de seleção do futuro fornecedor, os responsáveis pela gestão do processo, o prazo que a corporação entende adequado para sua completa execução, os riscos inerentes a esta futura contratação e isso tudo, minimamente, deverá estar em um documento próprio e consolidado da empresa (que pode ser um template replicável) que servirá de base para o controle das etapas seguintes e garantirá a adesão ou não da tecnologia ou serviço contratado de acordo com a própria necessidade do negócio.

Em alguns momentos, principalmente em organizações de maior porte, este planejamento pode produzir uma derivação que vai subsidiá-lo e que o mercado, comumente, chama de RFI (Request for Information ) e que serve para consulta a eventuais fornecedores ou prestadores de serviço que poderão vir a fazer parte do processo de negociação futuramente. É através desta chamada que se faz esclarecimentos mais técnicos, valida-se modelo de negócios ou contratos vigentes e políticas comerciais flexíveis e aderentes aos interesses de quem irá contratar. Este planejamento formal é quase sempre suprimido no processo de contratação pois é o que mais exige dos seus responsáveis. E aqui não me refiro somente a habilidades técnicas; Exige habilidade de liderança, comunicação, empatia, perseverança, resiliência entre outras pois a construção deste planejamento requer muita paciência, disciplina e organização. Há que se ter uma comunicação interna muito equilibrada, assertiva e profissional para que floresçam os conteúdos que virão a compor o plano de aquisição. Quem, dentro das organizações consegue reunir, isso, em um momento único ? Aqui a exigência e a existência de um método de trabalho é fundamental para o sucesso das próximas etapas já que esta contratação, dependendo da tecnologia ou serviço a ser adquirida, irá perdurar, na empresa, talvez por algumas décadas. Imagine se esta contratação for mal feita ou precipitada ? quanto de desperdício de dinheiro, tempo, recursos será gasto, porque alguém decidiu que ele conhecia a tecnologia ou o fornecedor, de maneira simplória, a ser contratada e não precisava planejar a sua aquisição ?

A segunda etapa do ciclo é a de Ida ao mercado. E obviamente, o próprio nome já a define, mas é por onde a maioria dos nossos gestores começa seu processo de aquisição, subtraindo, como dito acima, a etapa do plano de aquisição. E é bem fácil de entender o racional do imediatismo: uma área de negócios, por hipótese, deseja contratar alguma solução que melhore a eficácia das vendas da sua empresa e que permitirá controlar melhor o funil de vendas. A área de TI da empresa é chamada e, comumente assoberbada de coisas, faz o mais simples: liga para alguns fornecedores de soluções de software de relacionamento com o cliente (CRM) e pede apresentações técnicas da solução. A partir de então, começa o show de horror diário da improdutividade que vivem os compradores e vendedores de TI. Agendas bloqueadas com inúmeros interlocutores, apresentações bombásticas, shows pirotécnicos, teatros e circos armados em um picadeiro, onde o vencedor será aquele que passar a melhor “percepção” da sua tecnologia ao demandante. Não necessariamente a tecnologia ou serviço mais aderente ao negócio do contratante. Esta atitude precipitada, se seguida neste modelo, já elimina do ciclo as duas próximas etapas, sem que o contratante se dê conta do que fez e de como agiu. E sabe o que é mais engraçado neste processo ? Depois das inúmeras e fantásticas apresentações, a área de TI, ator principal desta etapa, de forma a homologar sua importância organizacional, senta e então escreve um documento chamado RFP ( Request for Proposal) onde, claramente, na própria escrita, do documento percebe-se, de forma subliminar, claramente, qual foi a melhor apresentação da tecnologia, com nome, endereço e cnpj da empresa vencedora. Não existe mais processo de escolha baseado nas necessidades do negócio. O que existiu foi um show comercial, bem realizado, por alguns exímios vendedores de tecnologia que, apenas na sua apresentação e nas páginas coloridas impressas “ganharam” o voto de confiança de um especialista técnico, que, de forma, provavelmente, subconsciente, redigirá uma RFP, direcionadas para a sua escolha antecipada. De forma involuntária a organização iniciou um ciclo negativo da sua aquisição.

A etapa de ida a mercado não é isso ou não deveria ser. Não é ceder a encantos comerciais preliminares. Não é colocar a carroça na frente dos bois. Aliás, muito longe disso. Se o planejamento da etapa 1 foi bem feito, o documento da RFP será resultado do próprio planejamento da organização, das tantas idas e vindas das RFI´s. Não há limite para estas trocas antes da ida ao mercado e da confecção da primeira versão da RFP. O limite é o convencimento de que o plano está sólido e levará a aquisição da melhor solução alinhado com os interesses da empresa contratante. Nenhuma apresentação será solicitada antes do documento ser entregue aos possíveis e futuros fornecedores. Eventuais apresentações, provas de conceito, folders, documentos do fornecedor já serão parte do texto da solicitação na RFP, que já terá critérios claros e objetivos de momentos de entrega, documentos exigidos e da seleção do fornecedor vencedor. É nesta hora, que a empresa valida seu plano, coloca em evidência sua intenção de aquisição e compreende o comportamento, as políticas comerciais de cada um, os limites e a rigidez contratual destes e restringirá, ou não, suas próprias exigências na escolha deste ou daquele parceiro comercial. Quem controla e dá o ritmo e a cadência desta etapa é sempre o comprador, e nunca o vendedor. Mas o dia a dia, da maioria das empresas, não é assim. A dinâmica da competição, a força e a estratégia dos vendedores participantes, a pressão por resultados acaba digerindo gestores e os colocando em uma máquina de moer carne; a necessidade de acelerar a contratação de algo ou alguém, lhe retira, psicologicamente, do processo de culpa por estar sempre atrasado com suas demandas. Assim, acelera apresentações, convida fornecedores incapazes ao processo, suprime discussões e análises importantes, e muitas vezes, baseados, em sua própria expertise decide sozinho quem segue ou não para a próxima etapa, correndo o risco de colocar sua própria carreira no ostracismo por não ter nenhum critério de seleção planejado, se o projeto ou contratação for um insucesso. Na sua ânsia de acertar, erra e falha.

Obviamente, quanto mais complexo e maior o investimento, tanto maior o cuidado de estabelecer diferentes sub-etapas dentro do processo de Ida ao mercado, já que, haverão, n cenários de validação técnica ou de critérios técnicos que deverão ser revisitados, antes de se iniciar a terceira etapa do ciclo, que é a negociação propriamente dita e que será descrita na continuidade do próximo artigo.

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