Quem ouve MAIS amplia seu poder de negociação
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- Categoria: Artigos
- Criado: Quarta, 24 Outubro 2018 14:48
- Escrito por Reges Bronzatti
Todo processo de negociação, seja no âmbito familiar, informal ou profissional, requer uma série de habilidades pessoais tais como: planejamento, capacitação sobre escopo, disciplina, ética, atitude, criatividade, flexibilidade e claro, poder de argumentação. Mas quero abordar aqui, o poder de obter resultados melhores nas negociações que a vida corporativa nos impõe e que praticamos pouco: ouvir mais e pensar bem antes de perguntar.
Algumas pessoas, que trabalham em áreas comerciais, possuem algumas destas habilidades intrínsecas, mas outras precisam aprimorar e desenvolver certas qualidades para que os seus interesses sejam relevantes dentro de uma atividade negocial. Uma delas, que considero, basilar ou preparatória para toda a estratégia posterior de convencimento e fechamento de um acordo é, comumente, esquecida ou praticada por poucos: realizar poucas e boas perguntas ( perguntas certas) e ouvir, com muita concentração, o seu interlocutor para que os verdadeiros interesses venham a tona.
Há, hoje, diversos métodos aprimorados sobre as melhores táticas de negociação para que um acordo de sucesso seja atingido ( o método de Harvard, por exemplo, considero um dos melhores). Mas o que muitos negociadores não se dão conta é de que toda e qualquer negociação é baseada em premissas basilares de ambos os oponentes: seus interesses intrínsecos e seu posicionamento exposto. O objetivo de cada parte é descobrir o real objetivo de cada um para que este modifique a sua postura e encurte o caminho para um acordo de sucesso para ambos. Se o objetivo não for este, teremos uma negociação que vai gerar um conflito, desgaste ou uma mera representação “teatral” ( maior parte das abordagens atuais ) e o insucesso é certo.
Imagine um iceberg. O posicionamento em um conflito negocial é a ponta deste iceberg: é ela que aparece sobre o mar. Em negociação, esta ponta se refere ao que é dito, de forma explícita, pelas pessoas. A sua posição é fixa, rígida e, geralmente, não abre espaço para a negociação em si, propriamente dita. Pode ser o caso, por exemplo, das pessoas que estão negociando, na área de tecnologia, um projeto de migração para a nuvem, dizendo: “eu quero migrar para a nuvem, pois quero reduzir custos da minha organização”. Esta é a posição.
Entretanto, no iceberg, há ainda, um tanto enorme de gelo submerso e normalmente a maior parte. Isto que está subjacente é o que, em negociação e/ou mediação, chamamos de interesse. Ou seja: é algo que está “oculto” ao que é dito pelas pessoas e diz respeito a sua real necessidade, àquilo que é efetivamente mais importante para elas, mas que por estratégia, não é claramente posto sobre a mesa de negociação de forma clara e transparente. Cada oponente reserva para si, como em uma luta, suas melhores armas, para utilizar em momentos derradeiros. Então, nenhum interesse, será colocado de forma aberta sobre a mesa de negociação. Quanto mais complexa, mais barreiras serão criados pelos contendores para dificultar a vida do outro lado.
Quando alguém fala que quer migrar seu ambiente tecnológico para a nuvem, é possível que esta pessoa esteja querendo mostrar, por hipótese, ações imediatas de inovação na empresa ou até mesmo dar mais velocidade para implantação de projetos idealizados pelas áreas de negócio, pois seu interesse é mostrar como a TI gera valor ao negócio através da inovação e agilidade, e não necessariamente em redução de custos direta, já que seu próprio cargo pode estar em jogo se ele, como gestor, for apenas uma pessoa operacional para a organização. Seu interesse pessoal pode ser em manter seu poder sobre ações de transformação digital dentro da corporação e não necessariamente que somente o preço seja o seu real objetivo. Neste caso, o que deseja mesmo é velocidade, poder e sucesso de execução. Preço é importante, mas não condiz com a sua posição na negociação. O seu real interesse é outro.
Veja que se o lado vendedor tratar a questão apenas em termos de “redução de custos”, é provável que combinações importantes fiquem de lado, tais como: Como vai se organizar o plano de transição de um ambiente para outro? Como negociar segurança de acesso dentro de um ambiente virtual a organização? Ou, ainda, quais serão os controles e monitoramento nos picos de utilização e uso de servidores virtuais que são bilhetados minuto a minuto?
Se o verdadeiro interesse é demonstrar ações da TI alinhadas ao negócio, o custo de um projeto de migração para a nuvem não é realmente o ponto que a negociação vai se fixar. A decisão do lado comprador, neste exemplo, dará preferência ao fornecedor que for mais submisso em entregar o poder do projeto ao comprador e executar com rapidez e segurança a migração. Então, a fixação do vendedor deverá ser em mostrar sua habilidade e “cases” de sucesso já realizados e menos no preço. A questão é como descobrir estes verdadeiros interesses ?
Para fixar, o conceito, vamos a um segundo exemplo, fora da área de tecnologia.
Quando alguém diz que quer R$ 20.000 de indenização e associa este valor solicitado ao dano causado em sua reputação, uma hipótese que podemos formular é que há, por trás deste discurso, uma questão de honra. Talvez, nem se a outra parte pagasse os R$ 20.000 esta pessoa ficará satisfeita, porque sua ferida pode ser muito mais profunda e dolorida.
Negociações que envolvem honra e reconhecimento, geralmente, nos afetam bastante, pois tocam em pontos centrais sobre quem somos e quem imaginamos ser. Assim, é raro alguém se sentir reparado apenas de forma pecuniária por danos como este.
Nestes casos, o que comumente vemos é que as pessoas se sentem mais reparadas quando são realmente ouvidas pela outra parte, quando conseguem externar seu sofrimento e seus danos, e quando recebem um pedido sincero de desculpas – além de um reparo financeiro que, muitas vezes, não chega ao valor inicial que ela havia pedido. E o ingresso em um tribunal, com uma ação judicial, por interesse, é apenas a tentativa de obter este pedido de desculpas “oficial” e sincero.
Se ambos os lados entendessem isso, de forma antecipada, sequer haveria uma ação judicial, mas apenas uma reunião conciliatória, com um mediador hábil, que conseguisse convergir para os interesses expostos na intimidade de ambos os lados.
Eis o poder de percepção e a capacidade de ouvir, ambos os lados, de um negociador ou conciliador. Lembre-se: sempre poder haver mais de um interesse por trás de uma posição! Cabe a um bom negociador encontrá-los.
Enquanto ambos os oponentes de uma negociação se concentram em suas posições não conseguem vislumbrar soluções diferentes daquelas onde o ganho de um significa a perda do outro. O processo negocial fica desgastante, agressivo e cansativo. Ao explorarem seus interesses, porém, conseguem chegar a uma solução onde ambos ganham.
Embora o entendimento teórico seja simples, dificilmente se encontrarão em negociações ou mediações corporativas, tal simplicidade. O ser humano acaba esquecendo da teoria, no calor da hora. É comum os negociadores, diante de um impasse, mesmo que pequeno, não atentarem-se para o fato de que ambos estão discutindo posições rígidas. Um dos motivos pode ser a grande quantidade de informações técnicas que um lado utiliza. Não estando acostumado com determinado conhecimento, um dos lados, vai tentar desprender uma quantidade grande de sua atenção e concentração na parte técnica. Com isso, outras questões do negócio em si, a serem observadas, passam desapercebidas. Por exemplo: Nenhum dos lados se concentra em tentar obter qual é o interesse do outro lado para avançar com mais leveza na negociação, tais como, o lado vendedor está sendo comissionado, em que formato ? ele possui um prazo para fechar o negócio ? isso o qualifica para dar mais velocidade no fechamento ou o qualifica para dar mais flexibilidade no escopo técnico de uma proposta de alta complexidade ?
Então, qual é a melhor maneira de se descobrir os interesses do seu interlocutor e consequentemente mudar a posição deste ?
Você já deve imaginar qual é a resposta.
Não há maneira melhor de checar um interesse do que fazendo perguntas. Mas não é qualquer pergunta. São as perguntas abertas que ajudam a explorar o que pensa, como age, porque deseja determinado produto ou serviço ou que benefícios procura.
As perguntas abertas são uma ótima forma de estabelecer uma conexão com alguém por meio de uma conversa. Diferentemente das perguntas fechadas, as perguntas abertas incentivam trocas mais profundas e significativas entre duas pessoas. As perguntas abertas indicam que quem pergunta está interessado em ouvir a resposta de quem responde.
Não procure respostas, procure as perguntas certas para encontrar dentro daquilo que ouvires, a resposta que lhe indicará os interesses do seu oponente comercial.
Muitas vezes, as perguntas abertas incentivam uma pessoa a falar sobre si. Ao fazer perguntas para dar prosseguimento à conversa, você pode continuar descobrindo informações sobre a pessoa. Perguntas abertas podem demonstrar interesse, compaixão ou preocupação com alguém. Essas perguntas requerem respostas mais pessoais e envolventes. Ao perguntar "O que você está pensando sobre...?" ou "Por que você está certo disso...?", você convida uma pessoa a compartilhar sentimentos. Perguntar "você tem certeza disso?" só exige que a pessoa responda "sim" ou "não." Faça perguntas abertas para iniciar uma conversa com uma pessoa quieta, nervosa ou desconhecida. Essas perguntas podem fazer a pessoa se sentir à vontade e incentivá-la a se abrir e a contar os seus verdadeiros interesses e não a sua posição. Use perguntas abertas para evitar pressionar, iludir ou influenciar a resposta de uma pessoa. A maioria das perguntas abertas são perguntas neutras. A forma como as perguntas fechadas são feitas pode fazer com que uma pessoa se sinta pressionada a responder de uma determinada forma. Por exemplo, uma pergunta indutora poderia ser: "Você acha este serviço caro ?", enquanto uma pergunta aberta neutra seria: "O que você entende que este serviço pode agregar a você ?" Complementos como "você não acha?", "não é?" ou "não é verdade?" podem transformar perguntas abertas em perguntas indutoras, sugerindo que a pessoa com quem você está falando concorda consigo. Não os use jamais com perguntas abertas.
Além disso, outra técnica bastante eficiente, em uma negociação, é fazer resumos, tentando captar o interesse e o sentimento da pessoa. Ao fazer resumos, você dá oportunidade de a pessoa organizar seu pensamento e verificar se efetivamente disse aquilo que é importante para ela. Um exemplo de resumo, para o primeiro caso, seria: “Pelo que eu entendi do que você falou, é importante para você a questão da migração segura e do cronograma ser executado antes do final do ano, é isso?”.
Um ponto importante para finalizar: durante uma negociação é preciso ter foco e concentração enquanto o outro interlocutor fala. Se, durante a fala, você já está pensando na próxima pergunta ou resposta que dará ou algo que queira complementar, você já não está mais escutando seu cliente, pois seu cérebro está mais preocupado em seus pensamentos do que efetivamente com o que seu cliente está falando. Relaxe e escute o seu interlocutor. Não monte um diálogo decorado. A partir desta melhora na sua capacidade de ouvir, exercite o poder de fazer menos perguntas, mas de forma aberta e certeiras no ponto em que entenda possa abrir o diálogo que o levará a descobrir os reais interesses do seu oponente. A prática deste exercício, leva a perfeição de um grande negociador. Bons negócios a todos !
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